casa em jaú: estruturação a partir da terra e do espaço

no escritório Aalva Arquitetos, cada projeto é concebido a partir da relação entre contexto, materialidade e espacialidade, explorando a interação entre cheios e vazios, entre opacidade e transparência, entre proteção e permeabilidade. a casa em jaú exemplifica essa abordagem ao investigar como a arquitetura pode ser estruturada a partir do próprio terreno e do ambiente ao redor, estabelecendo um diálogo entre a geometria construída e a paisagem.

A solução adotada para a cobertura, com um telhado invertido que direciona a água para uma calha central, é um dos elementos que conferem identidade ao projeto. Cada projeto nasce do entendimento singular do seu território, na qual a implantação responde a um lote mais compacto, onde a necessidade de delimitação e estruturação espacial se faz mais presente.

Com um terreno de aproximadamente 250 metros quadrados e uma área construída de 266 metros quadrados, distribuída em dois pavimentos, a residência foi concebida a partir da necessidade de estabelecer um equilíbrio entre privacidade e abertura, contenção e fluidez, introspecção e conexão com o exterior.

Implantação: Construindo Limites e Criando Espaços Internos Qualificados

O projeto parte da compreensão da escala do terreno e das condicionantes do entorno. No momento da concepção, os lotes vizinhos ainda estavam desocupados, o que trazia uma incerteza quanto ao desenvolvimento futuro da vizinhança. Diante desse cenário, tornou-se essencial a criação de um fechamento perimetral que garantisse proteção, privacidade e controle sobre os espaços internos, sem comprometer a permeabilidade visual e a relação com o exterior.

A solução adotada foi a construção de muros estruturais que organizam e definem os limites da casa. Mas, ao contrário de um simples enclausuramento, esses elementos foram pensados como parte da composição arquitetônica, permitindo a formação de pátios internos e vazios estratégicos que proporcionam iluminação natural, ventilação cruzada e espaços de respiro dentro do conjunto.

Nesse contexto, a terra – material abundante na região – foi incorporada de maneira expressiva ao projeto. A terra roxa característica de Jaú, amplamente conhecida por suas propriedades agrícolas, foi utilizada na composição dos volumes superiores, conferindo textura, tonalidade e identidade à residência.

Estruturação Volumétrica e Organização Espacial

A partir da definição desse perímetro construído, o projeto se organiza a partir de dois blocos suspensos, dispostos longitudinalmente no lote. Esses volumes, que abrigam os dormitórios, são suportados pelos muros laterais estruturais e estabelecem uma relação de leveza e suspensão, criando um jogo de contrastes entre massa e vazio, entre peso e transparência.

Abaixo desses volumes, o pavimento térreo se desenvolve de forma mais fluida, marcado por amplos fechamentos em vidro que garantem integração visual entre os espaços internos e externos. Dessa forma, a casa se estrutura em dois momentos distintos:

  • O térreo, aberto e permeável, onde os espaços se conectam de maneira mais livre e integrada, permitindo múltiplas relações com os pátios e áreas externas.
  • O pavimento superior, mais introspectivo e protegido, onde os volumes de terra compactada conferem uma sensação de abrigo e solidez.

Essa inversão da lógica convencional dos materiais – onde o que normalmente seria concreto suspenso aqui é terra compactada – cria uma composição visual que reforça o diálogo entre tradição construtiva e experimentação formal.

A Passarela Suspensa e o Pilar Central como Elemento Estruturador

Entre os dois blocos superiores, um espaço vazio se transforma em um pátio central, responsável por garantir iluminação e ventilação aos ambientes internos. Esse vazio é atravessado por uma passarela metálica suspensa, que conecta os dormitórios do pavimento superior.

A passarela, sustentada por um único pilar central, torna-se um elemento de destaque no projeto, funcionando como articulação entre os volumes e eixo estrutural da composição. Esse pilar, além de sustentar a passarela, também assume um papel funcional na drenagem pluvial, recebendo e direcionando a água captada pelo telhado invertido.

Essa solução evidencia um dos princípios fundamentais do projeto: a arquitetura como expressão da estrutura. Aqui, cada elemento construtivo não é apenas um componente funcional, mas também um gesto formal e conceitual, reforçando a unidade do conjunto.

A Relação com os Espaços Livres e a Distribuição dos Ambientes

A implantação da casa foi pensada para que os espaços livres não fossem apenas remanescentes do lote, mas partes integrantes do projeto. Os pátios internos desempenham um papel essencial na qualidade dos ambientes internos, trazendo iluminação natural, ventilação cruzada e uma relação constante com a paisagem interna da casa.

A organização do térreo reflete essa lógica:

  • Na parte frontal, próxima à entrada, encontram-se o escritório e o lavabo, garantindo privacidade e controle visual em relação à rua.
  • Ao fundo, um espaço mais reservado abriga a lavanderia e áreas de serviço.
  • No centro do térreo, os espaços de estar, jantar e cozinha são organizados de maneira fluida, conectados ao pátio interno e às áreas externas, criando um ambiente de convivência contínuo.

No pavimento superior, a distribuição dos dormitórios segue o mesmo princípio de organização espacial:

  • No bloco posterior, situam-se as suítes dos filhos, voltadas para o pátio interno.
  • No bloco frontal, encontra-se a suíte do casal, que se beneficia da privacidade conferida pela posição elevada e pela relação controlada com o exterior.
  • A passarela central, além de conectar os dormitórios, estabelece uma continuidade espacial e visual entre os dois blocos, reforçando a fluidez da circulação.

Materialidade e Expressão Visual

A escolha dos materiais foi orientada por um diálogo entre peso e leveza, entre opacidade e transparência. O uso da terra compactada nos volumes superiores confere uma sensação de solidez e ancoragem ao projeto, enquanto os elementos estruturais em concreto branco e os fechamentos em vidro trazem leveza e permeabilidade.

Esse contraste se manifesta em diversos aspectos da composição:

  • O piso térreo, em concreto branco, parece emergir do solo, enquanto os volumes superiores de terra compactada flutuam sobre ele.
  • A relação entre materiais pesados e elementos translúcidos cria um jogo de luz e sombra ao longo do dia, modificando a percepção dos espaços.
  • A inclinação invertida do telhado não apenas direciona a água para a calha central, mas também reforça o desenho geométrico da casa, tornando a captação pluvial um elemento expressivo da arquitetura.

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A Casa em Jaú é um exercício de estruturação espacial a partir do próprio contexto. Mais do que um abrigo, ela se constrói como uma resposta às condições do lugar, à materialidade disponível e às relações entre interior e exterior.

Através da organização volumétrica, do uso consciente dos materiais e da construção dos limites, o projeto busca equilibrar proteção e permeabilidade, solidez e fluidez, introspecção e integração com o meio. Dessa forma, a residência não apenas se insere no território, mas torna-se uma extensão dele, ressignificando o espaço construído e sua relação com o entorno.